terça-feira, 8 de novembro de 2011

Na Rua da Quitanda

Estava na Rua da Quitanda ontem, em meio a prédios enormes, gente estilosa, com dinheiro, sapatos bonitos, roupas bonitas, pessoas pobres e os camelôs que estavam vendendo echarpes que eu gosto muito. Entrei numa loteria achando que ia comprar um cartãozinho, mas que só vende em banca de jornal. Fiquei um tempinho esperando a fila andar, e chegando perto da minha vez, olhei pro lado e vi um moço, e lembro de ter pensando na primeira impressão: eu o admiro (admiro pessoas batalhadoras, como ele, que não tem motivo para desistir). Era catador de latinha, ou devia catar outro tipo de coisa; estava cheio de sacolas com muito conteúdo. Ele, de cabeça baixa, andou como quem quisesse passar para o lado de fora da loteria. Olhei para seu rosto, dei passagem e sorri. Ele olhou pra mim surpreendido e disse baixinho: Vai na fé que o que importa é ter saúde. E eu disse sorrindo, é verdade. Ele foi. Eu andei na fila, pedi um cartão de jogos e a atendente disse: só se encontra esse cartão em banca de jornal. Sai dali bem, feliz e sorridente. Porque sei que somos todos iguais. Não tenho renda alguma, minha mãe vira um dobrado pra sustentar meus caprichos, e eu a agradeço muito por me sustentar também. Além dos caprichos (que hoje em dia são muito importantes) tem a saúde que tenta vir em primeiro lugar, depois os estudos, e mais outras coisas que são necessárias na nossa trajetória. Sendo eu, uma menina de classe média, inteligente, observadora e cheia de caprichos, saí dali sorridente sim, porque eu sei a situação que enfrento em casa. Lembrei de como me sinto quando dou ouvidos ao meu pai, e de tudo que culpo ele por não ser tão responsável por uma família. Mas o admiro por ele ser um homem que a sociedade desvaloriza, ser pobre, não ter ambições materiais, nem pensar em riqueza, por ser sábio, vivido, experiente, um homem de amigos, amigo e excepcional. Meu pai é um verdadeiro herói, porque seus problemas são inúmeros.
Uma pessoa que estuda à beça pra fazer uma prova, um concurso, vestibular, se frustra por não conseguir se classificar de maneira que é capaz de largar tudo de mão, se revoltar contra a vida. Ele, que passou pelo que tinha que passar, deixou inúmeras oportunidades passarem pela vida, entregou-as de mãos beijadas ao destino, em muitos lugares, é desvalorizado pelas pessoas que o cercam, pelo seu traje, seu jeito destemido, desenvergonhado.. imagino que por essa cabeça, esse sentimento de frustração passe várias vezes, mas é um homem que não desiste.
Admiro homens como ele, geralmente são sábios e destemidos da humanidade. São pessoas que pedem confiança, mas não confiam em ninguém, e além de muitas coisas, capazes de amar verdadeiramente.
Não sei exatamente em que situação estava uma pessoa antes de passar a morar na rua. Não sei se por drogas, ou se foi expulsa, se porque quis, ou se dormiu uma noite na rua e se acostumou, se perdeu o fio da meada, se bateu com a cabeça. Lembro de quando eu era criança, sempre tive a mente muito ocupada por um turbilhão de pensamentos e reflexões. Tinha meus anseios e não entendia coisas de adultos. Não entendia como eles complicavam tanto as coisas, logo as que eram as mais simples. Pensava: “ninguém entende um mendigo, não sabe porque ele mora na rua, não podem julgá-los tanto assim.” Eu pensava com as minhas palavras, mas no sentido de saber como deve ser grande um fardo de uma pessoa frustrada, que não teve ainda ou perdeu oportunidades de crescer na vida.
Hoje não entendo mais como são as coisas de criança. Queria sempre crescer e saber de tudo. Mas não tem jeito, elas sabem mais. Mas sei ainda de como deve ser um fardo enorme praquele que carrega, perder ou não ter ainda, por algum motivo, a oportunidade de crescer na vida, também, financeiramente. Antigamente, quando criança, pensava desse jeito, não deixando as pessoas julgarem tanto essas pessoas. Agora penso que talvez, muitas dessas pessoas simplesmente optaram por serem moradoras de rua, pelo fato que não quererem ser coniventes com o pouco caso que o Estado faz com a população, ou por não querer fazer parte da massa de manobra. A GRANDE massa de manobra. Por isso que digo que são pessoas excepcionais. São pessoas sábias, vividas. Sabem das coisas e preferem ser simples. Só não se encaixam na sociedade – e nem querem – por que sabem que a maior parte dessas pessoas são só capazes de olhar para dentro de si próprias ou apenas para os seus caprichos. Aquelas que trabalham em prédios enormes, falam mais de uma língua, estudam, trabalham ralam e suam para comprar um relógio de ouro, sapatos de couro italiano e vestidos finos. Realmente, este cara excepcional não entende e não merece essa sociedade hipócrita e mesquinha. Não merece compartilhar sua sabedoria com os mesquinhos. Em troca de quê ? conscientização ? Nós ouvimos tudo, refletimos com tantas frases de efeito, nos derretemos de amor, choramos por dó, mas no final das contas, fazemos só o que queremos e jogamos tudo o que mais importa no lixo. Tudo por capricho. Esse tipo de pessoa excepcional, nem liga mais se são ou não parte dessa sociedade do Rio de Janeiro, ou se são desprezados como um lixo. Eles abriram mão de suas expectativas e decidiram trabalhar duro e firme, quando quiserem. São pessoas vacinadas contra a mídia e a gripe suína. São como cães vira-latas que resistem a tudo. São homens de bom coração, mas que já conheceram muita maldade por aí à fora. Eles simplesmente decidiram viver corretamente, amar, respeitar, trabalhar, com dignidade, sem esperança, mas com fé de que vão conseguir seus objetivos: catar a latinha espalhada pelos empresários, advogados, balconistas, socialites, que jogam pela cidade do Rio de Janeiro. Eu os admiro por conta disso.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Sapato novo

Quando eu caminhava com os seus sapatos, o mundo virava do avesso de modo que me perdia diante da sua face, e era só beijar com seus lábios que os teus olhos não viam mais a minha presença, girando em torno de nós, entrando em ti por todos os lados, sentindo, voando e sorrindo. E os meus pés descalços, andando no chão do teu peito, descobriram os teus passos, que tantas vezes me pisaram. Teu abraço, único, tímido e quente me convidavam a viajar por dentro de ti, embora tua boca permanecesse fechada. Conheci a metade de mim, penetrando pelos poros dos seus sentimentos, e ali permaneceu a metade de mim. Se me desses um beijo, gostoso, seco, engraçado, logo pintava os lábios para sorrir lindamente para ti. Outras vezes eu flutuava estando com meu corpo bem ao teu lado. E sentia prazerosamente minha alma sorrir e chorar de alegria por te abraçar naquele instante. Quando tornava os teus braços a minha volta, por trás, meu coração a mim não mais pertencia. E lembro da gostosura que era beijar teu rosto e me esfregar na tua barba quando a gente não se conhecia mais. Demos as mãos, olhamos a frente, e no início de todas as coisas, deviam ter havido algumas pedrinhas, mas não consegui enxergar porque minha atenção se desviava para os teus olhares que me envolviam e diziam alguma coisa. Não víamos pedras. Criamos este laço. Foi quando coloquei em mim os teus novos sapatos e percebi que estes já estavam apertados.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

METADE

Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio;
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca;
Porque metade de mim é o que eu grito,
Mas a outra metade é silêncio...

Que a música que eu ouço ao longe
Seja linda, ainda que tristeza;
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante;
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade...

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
E nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas como a única coisa que resta
A um homem inundado de sentimentos;
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo...

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço;
E que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada;
Porque metade de mim é o que penso
Mas a outra metade é um vulcão...

Que o medo da solidão se afaste
E que o convívio comigo mesmo
Se torne ao menos suportável;
Que o espelho reflita em meu rosto
Um doce sorriso que me lembro ter dado na infância;
Porque metade de mim é a lembrança do que fui,
A outra metade eu não sei...

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais;
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço...

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para faze-la florescer;
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção...

E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade... também.

(Oswaldo Montenegro)

terça-feira, 24 de maio de 2011

" Jamais peça que alguém ame você. Jamais peça que alguém reconheça seu valor. Amor, admiração & respeito são construídos sem pressão, no terreno insubstituível da liberdade. Encante as pessoas que o rodeiam, surpreenda-as com atitudes inesperadas, diga palavras que nunca usou. Desse modo, descobrirá que o amor e a admiração são frutos espontâneos das janelas que construímos na mente dos outros. "
Augusto Cury

domingo, 22 de maio de 2011

Desejo vil

As minhas lágrimas estão demasiadamente
distante do meu sorriso. Se fazem em tantas
de modo que matariam a minha sede.

Os meus sorrisos de amor, aparecem, tão raros,
quando te vejo dentro de mim. Tão poucos,
pois, estes sorrisos, de modo que eu os colecionaria
para apenas regarem as flores; um para cada dia.

O amor que só ria, vive ainda no meu ser,
contudo mora nas tuas mãos, de modo que
o meu coração chora sua falta; faz minha alma padecer.

E a falta diz que o que almejo
nem todas as lágrimas podem matar,
nem, sequer, um sorriso apagar.
Ainda, só por todas as suas flores, o meu amor chorou
então, nem toda saudade partiu
de modo que almejo ainda te encontrar,
de sorte que todo desejo é vil.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

A MO R

No veículo da vida
tudo passa,
e os pedestres só usam bengala de ouro.
A vida que passa ligeira, na qual há
contornos, curvas e
limite de fronteira: cuidado, não ultrapasse para os canais onde só há tempo.
Revela caminhos um tanto quanto embaraçosos
e outros mais claros.

Eis que esta vida, ora bela
ora embaraçada,
abre portas a todos aqueles pedestres que souberem assentar-se em seu banco.
Pois bem aconchegante,
converte o ouro ao que
realmente é.
Poê-lhe em seu lugar.
E diz: aquele que possa pilotar este veículo
carrega em seu coração o combustível: que é o amor.